Por Joelson Nascimento in Quarka.com.br
Os antigos eram reservados nas palavras, porque se envergonhariam caso seu agir não estivessem à altura delas (Confúcio, Anacletos, IV, 22).
Zenão foi um fenício fundador da escola estoica de
filosofia que chega em Atenas por volta de 300 a.C. De acordo com Diógenes Laércio,
Perseu nos conta que, de início, Zenão recusava grande parte dos convites para
jantar por possuir uma aparência estranha (VII, 1). Crates, percebendo a
incompatibilidade de sua timidez com o cinismo, entregou-lhe uma panela cheia
de lentilhas para ser carregada pelo mercado, tarefa que Zenão não pode cumprir
por vergonha.
Zenão consegue transformar essa timidez em um caráter
rígido, livre das opiniões externas. Além disso, desenvolve uma objetividade no
trato com as palavras. Seu uso comedido e preciso lhe fornece uma capacidade de
identificar o kairós de forma tão competente quanto Górgias. Gostaríamos, então, de demonstrar com alguns exemplos extraídos da obra doxográfica Vida e Obra
dos Filósofos Ilustres, de Diógenes Laércio, traduzida por R.D. Hicks:
Diógenes afirma que as pesquisas de Zenão eram admiradas por sua precisão, por isso criticava as belas frases dos retóricos dizendo que eram semelhantes às moedas prateadas de Alexandre: “eram belas na aparência e bem arredondadas como as moedas, mas nem por isso eram melhores” (VII, 18).
Conta-nos Diógenes que certo dia um habilidoso
discípulo seu falou tão longamente e de forma tão soberba sobre determinado
assunto que Zenão chegou a propor que os pais do garoto o tinham concebido em
estado de embriagues (VII, 18). Para ele, era melhor tropeçar com os pés do que
com a língua (VII, 26).
Certa vez alguém lhe disse que alguns raciocínios dos filósofos
lhe pareciam concisos. Zenão concordou e acrescentou que ele deveria seguir esse
exemplo e usar uma quantidade menor de sílabas. Aconselhava a ter como exemplo
os atores, pois estes nos ensinavam a como falar energicamente sem abrir demais
a boca, pois quem assim o faz, é uma tagarela que sustenta absurdos (VII, 19).
Diógenes nos
fala que a um garoto que estava falando demais, Zenão disse-lhe que suas
orelhas estavam sendo direcionadas para a língua (VII, 21). A outro tagarela,
disse-lhe que o motivo de termos duas orelhas e uma boca era para ouvirmos mais
(VII, 21-24). Para aqueles que gostam de decorar palavras e expressões de
filósofos, sugere que mais útil seria se exercitássemos nossa mente para tirar
proveito do que ouvimos (VII, 22).
Zenão estava sentado em um banquete de forma
silenciosa. Quando alguém lhe perguntou o motivo de tal comportamento, ele lhe
pediu que avisasse ao rei que ali estava alguém que sabia calar (VII, 24).
O que podemos refletir sobre tal comportamento de
Zenão que valoriza o silêncio? Entendo que o filósofo nos lembra de nosso
caráter limitado em relação ao conhecimento. Se não somos sábios, como podemos
falar tanto sobre coisas que julgamos saber? Mesmo com certo conhecimento sobre
algo, Zenão nos mostra que a quantidade de palavras que usamos parece tentar,
com certa habilidade, preencher lacunas epistêmicas. Por vezes lemos ou ouvimos
discursos filosóficos que poderiam ser sintetizados em dois ou três parágrafos.
Mas como descartar a verborragia? Como se livrar da vaidade de usar citações
tão estranhas ao texto? A beleza para
Zenão estava na simplicidade (VII, 23), não nas formas habilidosas de
demonstração. E a que tudo indica, um escravo entendeu o recado:
Fixa, a partir de agora um caráter e um padrão para ti próprio, ou quando te encontrares com outros. Na maior parte do tempo, fica em silêncio, ou, com poucas palavras, fala o que é necessário (Epicteto, Manual, XXXIII, Trad. Aldo Dinucci e Alfredo Julien).
Muito boa reflexão. Falar menos e dizer muito é um desafio. Penso que seja por vezes paradoxal, porque precisamos desenvolver a linha de raciocínio e escrever ou falar pouco pode significar também pouca leitura.
ResponderEliminarNo caso de Zenao, a ênfase está na objetividade do discurso e no momento oportuno em pronuncia-los
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